terça-feira, 18 de maio de 2010

O homem sem rosto




No jogo plúmbeo da consciência,
que se afasta,
Tece-se o vagaroso elã
de ir longe,

demais.


Os passos se equilibram
sobre o fio vermelho no corredor.
Apontam, inaudíveis, em direção à sala,
os estalos da velha madeira envernizada,

demais.


A mão tateia as paredes brancas,
afasta a névoa em teia,
enche-se de calores úmidos,
e roça nos rasgos dum êxtase vazio,

demais.


O piso em falso anuncia o grito -
contido, abafado, silencioso: infantil.
O convite sussurra os cabelos,
o riso emerge da neblina, assustador;
são dentes e olhos brancos,

demais.

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O tilintar dos espelhos quebrados rompe a noite.
O rosto, de único golpe, afunda-se no deslocamento brusco
dos mil cacos que iluminam as ruínas em uma só cor:
terrivelmente uníssona;
terrivelmente real.

Os olhos revirados para cima
vêem recair sobre si sua imagem refletida

no céu sem qualquer estrela,
pesadamente negro.

Um comentário:

Diane Muste disse...

hoje o dia amanheceu cinza,
o ontem chupou-lhe as cores para se fazer entender.

sobraram o vento, a sombra e as lágrimas da chuva.

isso não é triste, não é alegre, não é mau, não é bom.


somos nós, vivos na carne.

até que enfim.